Reportagem do jornal Estado de Minas
Da prancheta para o iPadEsporte se rende cada vez mais às estatísticas e intervenções do mundo virtual
Kelen Cristina
Publicação: 18/03/2012 04:00
Eudes Pedro vigia os adversários do Atlético |
Início de temporada. Os principais jogadores da equipe se transferem de time. O dirigente olha o caixa do clube e a realidade é desanimadora. Ele precisa rebolar para montar um grupo competitivo e começa a quebrar a cabeça na busca de reforços. O cenário, bem conhecido no futebol, é ponto de partida para o filme Moneyball – O homem que mudou o jogo. A diferença é que Billy Beane, o protagonista, gerencia um clube de beisebol. Para reinventar sua equipe a custos mais baixos, ele recorre aos números, recrutando atletas desacreditados (e por isso mais baratos), mas com eficiência comprovada pelas estatísticas. A história, real, ficou famosa ao virar livro e ainda mais depois que ganhou as telas do cinema em filme estrelado por Brad Pitt. No futebol, esse roteiro também não é original e há muito a matemática é importante ferramenta na vida dos clubes.
A evolução tecnológica praticamente aposentou a prancheta – só mesmo a fiel companheira do folclórico Joel Santana resiste. A onda agora é montar estratégias e buscar informações sobre reforços no iPad. Pelo computador, técnicos e dirigentes ficam sabendo qual jogador é bom nos cruzamentos, quem é eficiente nos desarmes e quem tem alto índice de acerto nas conclusões.
No Brasil, a maior parte dos clubes assina o Footstats, que acompanha os estaduais, as séries A e B do Brasileiro, as copas Libertadores e Sul-Americana, além das Eliminatórias, Copa do Mundo e campeonatos europeus. Atlético e Cruzeiro estão entre os clientes. O programa fornece o índice de acertos de passes, desarmes e finalizações, entre outros. Detalhes que ajudam a direcionar o trabalho das comissões técnicas, dentro e fora de campo.
“No Footstats a gente fica conhecendo o ponto forte das equipes, o comportamento em campo, o jogador mais eficiente, o mais participativo. Isso orienta os treinos. Geralmente o que vemos nos jogos corresponde quase a 100% do que é mostrado pelos números. Raramente há alguma surpresa. Também temos um controle paralelo, feito pelo Cuquinha e o Alexandre Ceolin (profissionais do clube)”, afirma Eudes Pedro, um dos auxiliares do técnico atleticano, Cuca. Pelo computador, ele obtém dados que ajudam o treinador a armar o time de acordo com o rendimento dos atletas ou a tática dos adversários.
O programa ainda ajuda a situar a equipe em relação a futuros oponentes, diz Eudes. “Depois das rodadas comparamos os nossos números com os de outros times. Aqui em Minas, América e Cruzeiro. Também as principais equipes dos outros estados, que estão nos campeonatos Paulista, Carioca, Gaúcho. Cada estadual tem uma realidade, precisamos saber como estamos em relação às outras equipes.”
GIGANTES No exterior, o programa mais popular é o Prozone, de origem inglesa. É adotado por mais de 100 clubes (gigantes europeus como Manchester United, Arsenal, Chelsea, Real Madrid, Barcelona, Internazionale e Bayern de Munique, entre outros) e federações do mundo. Com ele a Associação de Futebol Argentino (AFA) monitora todas as divisões da seleção do país. A Uefa e a Fifa também usam o programa, que tem como diferencial avaliações de árbitros e levantamento físico detalhado dos atletas.
Sylvinho viu a invasão dos números na Europa |
Francisco Ferreira, ex-preparador físico do Cruzeiro e que passou duas temporadas no Al Ain, conheceu o Prozone nos Emirados Árabes e está trazendo-o para o Brasil. “Não são apenas números. Há também uma profunda análise tática, técnica e física dos times.”
Os observadores do Prozone assistem a cerca de 6 mil jogos por temporada, dos principais campeonatos do mundo. São mais de 12 mil jogadores de 25 países cadastrados. “Há clubes na Europa que não fazem contratação sem consultá-lo”, diz Ferreira.
Um desses casos é o Liverpool. Desde que Damien Comolli se tornou diretor de futebol dos Reds toda contratação tem de passar pelo crivo da estatística. “Para Luis (Suárez, uruguaio), olhei os últimos três anos, nomeadamente o número de jogos, que é um fator importante. Levamos em conta as assistências, atuações contra grandes times, diferenças de gols marcados em casa e fora”, afirmou, em entrevista à revista France Football. A afinidade com a teoria de Moneyball é tamanha que ele acabou se tornando amigo do verdadeiro Billy Beane.
Auxiliar técnico de Vágner Mancini no Cruzeiro, o ex-lateral Sylvinho conheceu bem essa realidade quando atuou na Europa: “Na Inglaterra é impressionante a avalanche de informações que eles têm sobre os atletas. Quando atuei no Manchester City, víamos o nosso scout logo depois dos jogos. Sabíamos o quanto a gente tinha corrido e como tinha sido o comportamento do adversário, por exemplo”.
No Arsenal, ele trabalhou com Arsène Wenger, um aficionado por estatísticas. “Na hora da contratação, ele dá muito crédito aos números, mas jamais deixa de lado a qualidade técnica e o aspecto emocional do atleta. O Arsenal é um clube que está entre os grandes da Inglaterra, mas tem um investimento baixo em comparação aos outros, como Manchester United, City, Chelsea e Liverpool. O Wenger sabe administrar isso muito bem.”
Análise da notícia:
Talento acima de tudo
O homem que mudou o jogo
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