05/04/2019
O futebol tem uma característica impar de ser ao mesmo tempo simples e complexo. A sua mera observação pode ser simples, já o seu entendimento deve levar em conta a sua natureza multifatorial e é então que chega a ser assustadora a sua complexidade. Um modelo quase perfeito da chamada Teoria do Caos.
Com as últimas descobertas em termos metodológicos desenvolvidas mais ou menos por volta da virada do milênio e começando a ser aplicadas desde então, muitos começaram a endeusar, eu inclusive, estes novos métodos de treinamento. Passamos então a classificar os treinadores entre antigos, tradicionais e ultrapassados em contraste com os novos, estudiosos e ousados.
O tempo, porém, tratou de nos mostrar que ainda há sim lugar para todas as vertentes, mas há confusões em termos de conceitos e análises, o que é normal para teorias recentes e que envolvam essa complexidade, além, é claro, do “fato” de que “todo mundo entende de futebol”, não é mesmo? Rsrsrs…
Em suma, não dá pra dizer que comparando a metodologia analítica, com a sistêmica, uma seja a certa e a outra errada! Pode-se no máximo dizer que uma é mais antiga e a outra mais moderna… a escolha fica ao gosto do freguês!
Um vídeo recente mostrando os jogadores do atual Real Madrid, em fila, sob o comando de Zidane (https://www.youtube.com/watch?time_continue=11&v=IhQXPhPDmYI) realizando treino analítico de finalização, gerou um debate: “Isso porque é o Zidane!, se fosse o “Zé das Camisas” da escolinha da esquina, todo mundo desceria o pau!”… Verdade! Difícil achar alguém no futebol com mais moral do que um Zidane! Fato! Mas vamos seguir por um outro raciocínio: Haveria algum mal em se realizar um treino deste tipo? Será que o Zidane não aplica outros tipos de treinamento de acordo com o que se prega hoje: Situações similares ao jogo, intensidade, pressão de tempo e espaço provocando intensidade para a tomada de decisão, etc.? Eu duvido!!!
Toda essa argumentação parece reforçar a máxima de que o que importa é o talento! Ou seja, mesmo com Zidane aplicando, também, treinos analíticos, “que heresia!”… ele simplesmente ganhou tudo com o Real em passado recente, tanto que o clube não mediu esforços para trazê-lo de volta!
Levanto então outras questões: Não é este um tipo de treino que os jogadores adoram? Chutar a gol? Não é também um treino que gera baixa demanda física? Então creio que deveríamos saber o contexto: em que dia dentro do microciclo ele foi aplicado? Trata-se de algo que pode ser aplicado até mesmo em um dia de regenerativo, complemento de treino, véspera de jogo… claro, desde que dentro do volume adequado!… e aí estão os jogadores felizes e sorridentes com o “Papai Zizou”…
Continuando na mesma linha: Será que um Telê Santana não teria o mesmo sucesso hoje? Duvido! Dos trabalhos recentes realizados por treinadores brasileiros: Marcelo Oliveira bicampeão brasileiro com o Cruzeiro: taticamente bem feijão com arroz, mas com a coragem para, sabendo a qualidade do grupo que tinha em mãos, liberar o time para um futebol ofensivo, técnico, de proposição e, acima de tudo, sabendo levar o grupo na base do diálogo, onde os próprios jogadores se fecharam em um pacto por empenho coletivo logo após uma crise que havia sido gerada por causa do horário de um voo de retorno para BH. Tudo isto, facilitado é claro, por um ambiente “família” entre jogadores e funcionários que já se tornara marca do clube.
Que dizer de Cuca, uma cara meio complicado no relacionamento pessoal, meio bipolar, segundo dizem, mas que fala a língua dos boleiros como poucos. Obcecado por vencer e que tenta cuidar dos mínimos detalhes, mas malandro o suficiente para aplicar os treinamentos que mais agradam os jogadores, como o “Treino Alemão”, por exemplo! Malandro também para fazer vistas grossas às festas de arromba de R10 no seu sítio de Lagoa Santa: Aqui cito um desses fatos que entram para o folclore do futebol e que me foi confidenciado pelo saudoso amigo Eduardo Maluf: Era impossível marcar treinos pela manhã no Galo na época do R10!!! Rsrsrs… Ou seja, houve uma eficiente gestão de pessoas para contornar situações e fazer com que o absurdo talento de R10, mesmo com toda a quebradeira na balada acabasse sendo decisivo em vários jogos daquela sobrenatural conquista de Libertadores! Lógico que nem sempre acerta, como por exemplo, quando não soube conduzir/esconder a sua insatisfação durante o Mundial no Marrocos, pelo fato do clube não ter nem tentado segurá-lo diante da oferta dos chineses.
Outro exemplo, Felipão, um cara boa praça (eu, pessoalmente, devo a ele um pedido de desculpas por um arroubo meu, quando em um momento de crise pessoal, tomei as dores por algo bobo do passado! Um dia quero ter a oportunidade de me desculpar!)… Continuando… um cara divertido e mestre na gestão de grupos! Em termos de treinamento e leitura do futebol é bom, mas não um revolucionário como um Fernando Diniz, por exemplo! Vejam tudo o que ele já conquistou… alcançou mídia e fama com aqueles times do Criciúma, Grêmio e Palmeiras da “motivação e pegada total”! Virou ídolo! Lógico que treinadores que conseguem um certo status, só vão pegar trabalho em clubes e seleções top ou que paguem “rios de dinheiro”!, onde terão as melhores condições para desenvolver seus trabalhos e as conquistas são consequência! Isto é a vida e não apenas o futebol! Os 7×1 foram sim, uma mancha pesadíssima em seu currículo, mas é muito fácil falar depois do ocorrido que ele deveria ter congestionado o meio de campo, etc.! Acredito que havia sim um clima difícil de administrar: misto de muita pressão com ufanismo/otimismo: Penta campeões, em casa, hexa é consequência e ao mesmo tempo obrigação… Algumas situações foram realmente discrepantes como a Alemanha com 100 analistas de desempenho vasculhando as minúcias dos adversários – o Brasil com apenas um, o competente Thiago Larghi, e apostando em discurso motivacional! Neste ponto sim, acredito que houve uma lição para sempre! Um divisor de águas em que se aprendeu que intuição é importante, mas o conhecimento detalhista tem mais peso! Em suma, o maior culpado: O modelo vigente, a estrutura arcaica que rege todo o futebol brasileiro como um todo!
Encerrando, acredito que há “n” linhas de pensamento e diversas óticas para o futebol. O talento ainda há de prevalecer, mas se somarmos este, a uma eficiente gestão de vestiário e tendo pelo menos o bom senso quanto à correta dosagem do treinamento, não importa a metodologia… há grandes chances de se alcançar êxito! Acredito até que um trabalho bem conduzido dentro dos conceitos da Periodização do Futebol, sistêmico, progressivo, tem mais chances de gerar um time mais apto para a intensidade! Mas, como ter os melhores talentos, é coisa para poucos, geralmente para os clubes mais ricos, a probabilidade de êxito do restante dos clubes deverá então passar necessariamente pela excelência científica e metodológica! Margem de erro próxima de zero! E… ainda assim, no final das contas, haverá sempre os “detalhes” que podem decidir as conquistas!
Saudações!
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