Creio que posso dizer, sem medo de errar, ou sem parecer arrogante, que conheço o Cruzeiro como poucos. E neste sentido, tenho sempre me posicionado com o propósito de contribuir, de alguma forma, com o clube onde passei boa parte de minha carreira.
O Cruzeiro sempre apresentou algumas peculiaridades que podem fugir à observação mais superficial. É um clube do povo! Foi formado pelos imigrantes italianos empregados como mão de obra na construção da nova capital do estado, em finais do século XIX… e dentre eles incluíam-se os “Rainoni”, meus bisavós paternos.
Somada à sua origem italiana, sanguínea, barulhenta… temos como mais um ingrediente, a sua trajetória gloriosa principalmente à partir dos anos 60, com esquadrões de refinada técnica. Ou seja, à partir daí, tínhamos que, não só vencer, mas também jogar bem e bonito… o que moldou então uma torcida extremamente chata e exigente, que cresceu muito, exatamente à partir desta época! Há nesta receita ainda um último tempero: a “Mineiridade”! Um povo tradicional, família, que trata os de fora muito bem, mas que exige reciprocidade e respeito pelas suas coisas!
Pois o Cruzeiro Esporte Cube se tornou então um patrimônio do povo mineiro! Segundo a última pesquisa da Placar, com aproximadamente 13 milhões de torcedores.
Bem, após a gestão criminosa que quase destruiu o clube em 2019, Ronaldo e sua equipe assumiram a bronca e vem fazendo desde 2021, exatamente aquilo que prometeram: uma gestão austera, responsável, pés no chão, que resulte no saneamento e na consequente sustentabilidade no médio e longo prazo. Há no entanto, alguns acidentes de percurso. Inevitável!
Com nomes de ponta como Autuori, Paulo André e outros, percebo uma gestão de excelência desde a base, formando uma forte identidade que certamente dará muitos frutos. Só que o exigente torcedor, traumatizado pelos longos 3 anos na Série B, espera resultados pra ontem. Oras, como gestor de futebol, defendo que não dá pra atropelar. Há um projeto em curso e ele demanda tempo. É preciso resistir com todas as forças às tentações de busca pelo resultado imediato, que seria estourar o orçamento em busca de uma contratação bombástica.
Vendo de longe, percebi nesta gestão, um certo distanciamento do povo azul. O torcedor sentiu muito a perda do Mineiro, um título que estava nas mãos, e que seria muito importante no resgate de sua autoestima. Ao mesmo tempo, ficou o alento por ver que um elenco bem mais barato e modesto, encarou o badalado Atlético de igual pra igual e só perdeu por conta dos equívocos nas substituições e da fatalidade de um pênalti acidental.
Pedro Martins soava como um cara muito atualizado, muito antenado nas questões administrativas, mas distante do torcedor e da mídia. Seu palavreado de coach realmente ficou chato e repetitivo, deixando uma impressão de que lhe faltava algo… tipo, uma maior experiência, ou um entendimento mais “raiz” do futebol.
Paulo André assume como executivo e, se eu puder dar uma dica, diria: aproxime-se do torcedor. Apareça! Dê satisfações, curtas que sejam, mas com muito mais frequência do que vinha sendo feito até o momento. Quem sabe, uma coletiva uma vez por semana, mesmo que não haja muito o que falar, nenhuma novidade, mas essa maior proximidade faz muita falta.
Na questão futebol, vejo um time que parece ter sentido a perda do Mineiro. Oscila dentro dos jogos (Atlético 2×2; Alianza 3×3; Atlético 0x3…) e se ressente de uma maior coerência. Eu, como gestor, diria ao Seabra: Escale sempre os melhores, escolha rapidamente o seu time base, dê sequência a este time, não tenha receio de usar a base!
Jogador respeita coerência! E o jovem de hoje, Geração-X, não aceita mais o “faz porque estou mandando!”, à la Luxemburgo! Não! Este jovem precisa ser convencido e a coerência é meio caminho andado!
Vamos então a algumas das inconsistências deste ano:
- Porque punir jogadores de melhor qualidade, ou potencial, como Zé Ivaldo e João Pedro, com banco, ou afastamento? Não estariam aí punindo o próprio time? Não seria mais indicada a punição no bolso? A multa? A caixinha?
- Porque substituições tão estranhas como as da derrota para o América?
- A eliminação para o Souza foi inaceitável pela forma como o time jogou. Um campo e adversário naquelas condições exigia um jogo de pegada, de matar logo e não tentar jogar na técnica ou com o resultado debaixo do braço. O castigo veio de forma cruel!
- Porque tirar de Rafael Cabral a braçadeira de capitão, quando ele se mostrava um líder com grande aceitação pelo grupo? Sua fala no túnel, antes de entrarem em campo para a vitória de 2×0 contra o Atlético na fase classificatória do Mineiro, foi simplesmente de arrepiar!
- Porque levar todo o grupo para o jogo no Equador e deixar os titulares quase todos no banco? O mais lógico não seria poupar esses jogadores, deixando-os em BH treinando e se recuperando para a final?
- Porque uma substituição tão ilógica na final, ao tirar um meia (Vital) e, ao invés de preencher o meio de campo, colocando um volante de qualidade como Ramiro, ou Cifuentes, repetiu o erro dos 3 zagueiros do 1º tempo do jogo de ida das finais, quando o time não viu a cor da bola? Este erro atraiu o Atlético todo pra cima.
- Porque na última derrota contra o Atlético deixamos o Scarpa tão livre, enquanto o Milito exigiu marcação implacável sobre o Matheus Pereira?
- Jogos preocupantes: 1º T do 2×2 contra o Atlético; 2º T do 3×3 contra o Alianza; 1º T do 0x3 contra o Atlético; o jogo contra o Lacalera…
- Jogos com bom futebol: Final do Mineiro; Fortaleza; Botafogo…
Do elenco atual, há um único jogador realmente diferenciado: Matheus Pereira! Há outros de boa qualidade e experiência como Ramiro, Romero e Lucas Silva. Outros que parecem ter potencial mas ainda precisam mostrar mais para se firmarem como Villalba, Cifuentes, Barreal… uns com potencial para recuperarem a forma como Verón e Bilu. De resto, são todos medianos e, destes, acho que alguns não irão mostrar mais do que o que apresentaram até agora como Vital, Rafa Silva, Rafael Elias, Arthur Gomes… são jogadores no máximo para composição de elenco e banco… talvez para entrarem com gás novo no 4º final dos jogos. Neste sentido, acho que falta uma maior oportunidade aos meninos da base – e que o Seabra conhece tão bem – pois acredito que dentre eles, deve haver jogadores que possam produzir mais do que os medianos já citados. Deposito esperanças no recém chegado Gabirel Grando, por alguns bons jogos que vi dele no Grêmio. Cabral estava mesmo sem clima.
Achei acertada a não insistência com mais um treinador estrangeiro, após as duas tentativas fracassadas com Pepa e Nico. Acompanhando de longe, ficou a impressão de uma certa falta de conhecimento da cultura do futebol brasileiro e a falta do entendimento de que, como o elenco é modesto, a margem de erro era mesmo pequena, ao contrário, por exemplo, do Milito no Atlético, onde a margem de erro é maior por conta de um maior potencial técnico capaz de compensar os equívocos naturais e/ou falta de uma maior familiaridade de um treinador estrangeiro e recém-chegado.
Concluindo, acho que, o elenco é melhor e mais comprometido do que o do ano passado, quando, no meu entender, demoraram para perceber que Gilberto não devia estar levando uma vida extracampo condizente com o que se espera de um atleta de alto rendimento. Era nítida a sua deficiência para a performance de intensidade. Com os recursos tecnológicos de hoje, como o GPS, fica fácil verificar os índices de corrida intensa e sprints. Neste ano, percebemos um time que tem mais aptidão para marcar gols, claramente a maior dificuldade do ano passado. Eu focaria 100% no Brasileiro e mandaria um time alternativo na Sulamericana!
P.S.: Me chegou a notícia de que Pedro Lourenço fechou a compra do percentual da SAF de Ronaldo! Como enxergo: Pedrinho traz para o Cruzeiro um pouco da paixão de um torcedor que faltava à gestão R9 e tomara que mantenha em boa parte a racionalidade da gestão deste. O Cruzeiro deve muito ao Pedro, que socorreu o clube em diversos momentos de dificuldade, mas ele tem a fama de ser muito impulsivo… Há rumores de que Lucas Kallas, dinâmico empreendedor do Grupo Cedro, entraria como um parceiro… a ver se procede! Com os rumores de que Alexandre Mattos pode vir a ser o novo executivo de futebol, uma coisa o torcedor celeste pode sonhar: O clube vai às compras na próxima janela e com isso pode capacitar bem o elenco atual, pois o cara é fera no mercado!
Saudações,
Francisco Ferreira
Executivo de Futebol – ABEX
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