VARIABILIDADE E BILATERALIDADE NA FORMAÇÃO NO FUTEBOL
Muito já falei sobre a importância da variabilidade como fator de enriquecimento das vivências motoras na formação de atletas de futebol. O exemplo de Pelé (assim como todos ou outros craques) e suas riquíssimas vivência motoras já foi debatido à exaustão, mas hoje me lembrei também de uma declaração do Rivaldo, em que ele disse que teve a “felicidade” de que “a rua em que cresceu tinha mais buracos do que as outras”, ou seja, ele teve essa variabilidade no ambiente como um componente que criava obstáculos/dificuldades no jogar que o obrigava a se adaptar: visualizar, processar, decidir e executar de modo eficaz a cada desvio da bola em algum buraco ou montinho e, como resultado, o casamento do fator ambiental/história de vida com sua genética e as oportunidades que teve, o levaram a ser eleito melhor do mundo pela FIFA em 1999.
Neste sentido, a teoria da Aprendizagem Diferencial, preconizada por Wolfgang Schollhorn da Universidade de Mainz na Alemanha e endossada por Paco Seirul-lo do Barcelona, https://ceperf.com.br/2017/06/18/teoria-da-aprendizagem-diferencial/ aparece como uma espécie de sistematização, por assim dizer, da “escola informal da rua / ou da bola“. Criar variações na execução é o que vai gerar um aprendizado mais rico e a aptidão para se adaptar, improvisar, encontrar soluções criativas para as situações problema durante os jogos.
Com este mesmo pensamento, o campo de terra do Palmeiras foi implementado no CT da base em 2023, como forma de incentivar/promover oportunidades/situações que demandem o improviso aos jogadores que são formados no clube. Antes disso, os comandantes da base do Verdão, com essa mesma ideia em mente, levavam os garotos a campos de terra ao redor da capital.
O terrão do Verdão tem uma filosofia: “Proibido treinadores. Somente formadores” e “Espaço de liberdade, improviso e autonomia”. A regra é que os garotos que entram ali despertem a criatividade. Os próprios garotos que escolhem seus times, suas posições em campo e não tem árbitro ou paradas para correções. O propósito é que os meninos se divirtam, tenham autonomia, alegria, liberdade para criar, inventar… Voltarem a ser crianças!
Uma outra estrutura que acredito que possa ser muito útil no desenvolvimento da bilateralidade e da ambidestria, seria uma espécie de quadra fechada de “Squash-Futebol”. Até hoje não vi em nenhum clube, uma estrutura física especifica para esse tipo de treinamento como a apresentada abaixo. A repetição com ajuda do paredão, desenvolve de modo natural a bilateralidade/ambidestria, a precisão nos chutes, recepção, domínio e virada de jogo.
TREINOS DE FALTAS/BOLAS PARADAS
Defendo também o desenvolvimento de uma técnica mais refinada através do treino de cobrança de faltas para todos os atletas de todas as posições, ou jogos com rodízio de posições de todos os atletas para desenvolver a versatilidade, ou polivalência, como diria o saudoso Cláudio Coutinho. No fim, todos os caminhos levam à rua! À Escola da Bola, marca registrada do futebol brasileiro!
O Mestre Telê Santana era conhecido pela rabujice em cobrar insistentemente o treinamento de fundamentos básicos de seus jogadores. Ele pegava no pé mesmo, exigindo repetições exaustivas de seus atletas. Seu perfeccionismo levou muitos de seus jogadores a evoluírem grandemente após terem atuado sob seu comando.
Há alguns pontos nesta temática que eu defendo com unhas e dentes: 1º) É inadmissível vermos jogadores profissionais que não saibam bater na bola; 2º) O fundamento básico do futebol é o “chute”, seja para dar um passe, um lançamento, chute a gol, ou cobrança de bola parada (falta, escanteio, tiro de meta…); 3º) Todo grande jogador da história apresentou como uma de suas principais habilidades básicas a precisão/qualidade neste quesito… Por esta razão, defendo que todos os jogadores, não importa a posição, sejam submetidos, à exaustão, desde a base, a este tipo de treinamento.
O treino de repetição no paredão em diferentes distâncias e com ambas as pernas, buscando a expertise no chute (passe, chute a gol, lançamento, cruzamento, tiro livre direto, etc.) com variações mil que destaquem ainda a habilidade de percepção espaço-temporal e cinestésica para recepção, domínio, giro e virada de bola em até 180º se apresenta como uma excelente ferramenta para o desenvolvimento da coordenação motora e consequentemente de uma técnica refinada e automatizada. O desenvolvimento da bilateralidade & ambidestria é concomitante a um enriquecimento das sinapses nervosas e da rede neuronal, consciência corporal, etc., podendo beneficiar todo o desenvolvimento técnico geral do atleta e não apenas do fundamento específico ora treinado.
Já na Abordagem Centrada no Jogador, difundida pelos belgas (Kris Van der Haegen), o princípio é o mesmo: estimular o prazer pelo jogo, proporcionar oportunidades de jogar para todos, adequar todos os conteúdos e demandas de forma pedagógica/progressiva para cada idade: Tamanho de campo, bola, traves; Número de jogadores; Tempo de jogo e Conteúdos programáticos. https://ceperf.com.br/2018/12/31/revolucao-treinamento-que-levou-belgica-ao-topo-mundo/
No link acesse um material que desenvolvemos sobre a aquisição de condicionamento físico através dos jogos em campo reduzido. Há toda uma lógica na elaboração destes jogos implicando em tamanho dos campos, número de jogadores, tempo de jogo, número de séries, tempo de pausa, progressões e qualidades trabalhadas que pode ser aplicada por toda uma temporada. https://ceperf.com.br/2012/02/12/condicionamento-fisico-em-campo-reduzido/
Finalizando, creio que o entendimento sobre número de jogadores nos jogos reduzidos e a estrutura naturalmente demandada pelos jogos auxilia em muito na escolha/planejamento de acordo com o que se deseja trabalhar.
Saudações!
Francisco Ferreira
Gestor de Futebol
ceperf.com.br
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