⚽️ TEORIA da APRENDIZAGEM DIFERENCIAL

A teoria de treino que é «arma secreta» e «parte do sucesso do Barcelona»

Paco Seirul.lo praticou-a na Catalunha, Wolfgang Schollhorn falou dela nas Football Talks e ao Maisfutebol

Luís Pedro Ferreira
Adaptado por Francisco Ferreira
Barcelona vs At. Madrid (REUTERS)
Barcelona vs Atlético Madrid (REUTERS)
http://www.tvi24.iol.pt/internacional/wolfgang-schollhorn/a-teoria-de-treino-que-e-arma-secreta-e-parte-do-sucesso-do-barcelona#

 

Quando, na transição para o século XXI, Paco Seirul·lo começou a experimentar uma nova abordagem para o treino, estava também a moldar o futuro de uma das equipas mais vencedoras da história do Desporto e, possivelmente, a maior do futebol até o momento.

Aquilo que o atual diretor da área de metodologia do Barcelona pôs em prática em 2000 foi teorizado pelo professor Wolfgang Schollhorn, da Universidade de Mainz, Alemanha.

A «Differential Learning» (Teoria da Aprendizagem Diferencial) rompe com a ideia tradicional, no futebol e no desporto em geral, de que a repetição é o melhor método para se desenvolver o jogador. Schollhorn defendeu o contrário e Seirul.lo foi provando que estava correto. «Aqueles jogos de tiki-taka? Os atletas mais velhos, habituados à repetição, simplesmente não os conseguiam fazer», revelou o alemão, ao Maisfutebol, após intervenção nos Football Talks organizadas pela Federação Portuguesa de Futebol.

O conceito: Os jogadores aprendem pela adaptação 

Na ideia de Wolfgang Schollhorn, não há repetição no treino nem correção de erros. Os jogadores aprendem de forma intuitiva a adaptar a técnica e, igualmente importante, adaptar a decisão a tomar perante aquela circunstância. São, por assim dizer, levados a assumir maior responsabilidade.

«Alguns jogadores não têm nenhum problema com esta metodologia, outros estão muito habituados a receber instruções. Digo que estes últimos são preguiçosos. Estão habituados à preguiça. “Está aqui alguém a me dizer o que fazer, a responsabilidade é dele e não quero saber do resto.” Mas no campo eles têm de decidir por eles próprios, não podem olhar para o treinador e perguntar se este passe é correto ou não. Assumem a responsabilidade desde o início e isto tem grandes consequências no jogo.»

Comecemos pela técnica antes da tática. O professor universitário dá conta de um estudo que teve por base o chute a gol. Pré-teste, um de dois grupos obteve 463 pontos. Depois, treinou com metodologia de repetição, ou seja, tentativa de reproduzir as mesmas circunstâncias. A pontuação subiu para 487.

Um segundo grupo fez 474 pontos antes do teste, mas foi-lhe aplicado a Teoria da Aprendizagem Diferenciada depois. Na grande tela do auditório do Centro de Congressos do Estoril aparece, então, um vídeo com um exemplo extremo, e sublinhe-se o extremo, do que são as variações.

Um jogador aproxima-se da bola usando um só pé e chuta; outro corre com um braço no ar e outro ainda chuta com o pé de apoio claramente distante da bola – em campo, o corpo de um jogador não parte sempre da mesma posição, pode ser importunado por um adversário, o gramado ou outro fator qualquer e o jogador tem de, adaptar-se.

No final, quando foi para chutar a gol, este segundo grupo terminou com uma pontuação de 617.

O professor universitário indicou: «Quando usamos a repetição, o nosso cérebro fecha, é como se estivéssemos a dormir.» Por outro lado, as variações estimulam a percepção de um jogador, levam-no a encontrar a técnica mais indicada para a situação.

Taticamente, como é que é isto?

Wolfgang Schollhorn fala com o Maisfutebol depois da intervenção e é quando lhe perguntamos se isto se aplica a nível tático que a explicação do alemão é mais compreensível para quem não o viu no auditório.

«Um sistema tático, seja ele qual for, também tem variações. Numa abordagem tradicional, essas variações significam erros. Os tradicionalistas tentam reduzir o erro do jogador, enquanto nós dizemos: “Eles não estão cientes deste erro. Por isso, aumente-se o erro para eles verem a consequência. E assim que eles experienciam a consequência, aprendem por eles próprios.”» O treino tático deve, também ele, ser diferenciado para cada jogador.

O alemão acrescenta que «é assim que aprendemos a andar de bicicleta, ninguém nos explicou como funciona».

Para além disso, «as coisas que aprendemos por nós próprios nunca se esquecem, no que é ensinado por outros há um efeito de memória e dentro de duas semanas está esquecido».

Não é apenas no futebol que esta teoria tem surtido efeito. Quando questionado se afeta a liderança de um treinador, Schollhorn admite que sim. Para melhor a quem a aplica: «Assim que implementamos este sistema diferenciado nas fábricas de automóveis o nível de doenças nas empresas baixou e a motivação aumentou.»

«Os velhos do Barça não conseguiam jogar tiki-taka»

Voltemos ao futebol. Deve ser isto aplicável apenas na formação ou incluir também os jogadores veteranos? Também os mais velhos ganham com este tipo de abordagem.

«Temos estudos com pessoas de 70 anos que começaram a ter aulas de tango e, em quatro semanas, repito, em quatro semanas apenas, a postura e equilíbrio deles atingiu o nível de pessoas de 40 anos», disse Schollhorn.

Pois bem, então e um jogador veterano, com 36 anos, que teve uma carreira de sucesso? «É mais difícil eles acreditarem nesta metodologia porque foram bem-sucedidos com o método anterior até aos 36», começou por indicar o alemão.

«Isto foi observado há 10/15 anos, quando a média de idades das equipas europeias baixou de forma impressionante. Perceberam que os jogadores mais velhos não estavam dispostos a estas variações e, por isso, não faziam sentido. Foi extremamente visível no Barcelona. Não vou mencionar nomes, mas aquele tiki-taka, com apenas um contacto, era impossível para os jogadores mais velhos. Pura e simplesmente, não conseguiam acompanhar. Era demasiado rápido para eles, porque foram habituados a um treino diferente.»

Adendos meus (Francisco Ferreira):

a) “Talvez tenha relação direta com um estudo feito em Portugal que mostrou que equipes com média de idade superior a 28 anos, aumentam em 50% as suas chances de rebaixamento”.

b) “A variabilidade aumenta o aprendizado, premissa básica e abrangente dos programas motores generalizados: Experimente, erre, tente novamente, varie, compare, escolha/decida como fazer, entendimento/compreensão/fixação”. Criar pequenas dificuldades (condições não ideais) que obriguem a adaptações. Meu artigo “Qual era o segredo do futebol brasileiro?” indica isso: Campinho de terra, rua, buraco, montinho, descalço, bola de meia… Não padronizações proporcionam mais experiências/vivências de adaptação. Consequentemente, levam portanto a uma maior riqueza de acervo motor…”. “Minha sorte é que cresci jogando bola em uma rua que tinha mais buracos do que as outras! (Rivaldo)”  

c) “Não há gesto técnico correto, o que deve ser considerado é eficiência e/ou eficácia, o que envolve a capacidade de adaptação do atleta para fazer com que determinada ação possa ser bem sucedida, ou seja, atingir o seu objetivo”. 

Rápido na técnica e na tomada de decisão… Assim é o Barcelona!

No entanto, há exceções em que Schollhorn admite usar a repetição: «Descobrimos que se alguém for psicologicamente estável, podemos variar o que quisermos na parte motora. Mas quando alguém é instável psicologicamente, pede repetições para ganhar controle.»

O alemão exemplifica com crianças, no momento em que vão para a cama. «Normalmente, lemos-lhes livros, mas para eles são não-livros, porque eles já sabem o que acontece», iniciou.

«Se nós mudarmos algo na história, eles vão dizer: “Não é assim.” A repetição dá-lhes uma sensação de controle e assim podem dizer adeus à segurança do dia e entrar na insegurança da noite”. Agora, o que descobrimos é que três repetições chegam para dar essa segurança», concluiu sobre o tema.

«Não conheço ninguém em Portugal que siga isto, mas era assim também no Barcelona…»

Assim que subiu ao palco do auditório, Schollhorn lembrou que já tinha estado em Portugal há cerca de dez anos a falar sobre isto. No entanto, não sabe se influenciou algum dos treinadores portugueses, ainda que se encontrem algumas publicações em que é citado.

«Não conheço ninguém aqui que siga esta ideia, mas era o mesmo com o Barcelona, nenhum clube fala sobre isto», disse e passou a explicar: «Em algumas áreas, é considerado arma secreta. Não se fala sobre isto, porque quem aplica, tem uma vantagem que não quer desperdiçar. Mas quanto mais cedo se reconhecer isto, maior é a probabilidade de sucesso.»

Paco Seirul.lol e Wolfgang Schollnor encontraram-se várias vezes desde 2001. O espanhol começou por um método simples e depois sistematizou a Teoria de Aprendizagem Diferencial. Aplicou-a não só à equipe de futebol do Barcelona, mas também às restantes modalidades do clube.

«Se foi peça-chave do êxito deles? O sucesso de uma equipa tem de ser visto por mais do que um fator, mas foi uma parte», terminou Wolfgang Schollhorn.

 

Saudações!

⚽️🇧🇷🏆 FRANCISCO FERREIRA
CEO do Centro de Excelência em Performance de Futebol 
Gestor Técnico / Executivo de Futebol 
Representante WFA & GPS no Brasil
Associado ABEX-Futebol
CBF Licença A
+(55) 31 99104-9620 / 3444-4724  
Share Now

Related Post

Escreva seu comentário