⚽️ SAF – UM DIVISOR DE ÁGUAS NO FUTEBOL BRASILEIRO

SAF – UM DIVISOR DE ÁGUAS NO FUTEBOL BRASILEIRO

E eis que a tão sonhada modernização e redenção do futebol brasileiro finalmente tem o seu capítulo mais ousado e radical. A alteração da legislação que rege as entidades esportivas, permitindo na prática que os clubes possam ter donos, traz novas perspectivas para todos aqueles que desejam um futebol mais justo, decente e inteligente.

Cruzeiro e Botafogo, não por acaso dois dos mais tradicionais e também mais enrascados dentre os grandes clubes, saem na frente e certamente puxando uma longa fila!

Tendo em vista o fracasso retumbante do modelo associativo no nosso país, atrelado desde sempre a uma legislação arcaica que era na verdade um convite à corrupção e à gestão desleixada, o modelo SAF se apresenta como a tábua de salvação! O modelo antigo, baseado na política, era completamente viciado: Entidades privadas sem fins lucrativos, conselhos deliberativos que elegem seus presidentes e diretores com base nos interesses, no toma-lá-dá-cá, a não responsabilização patrimonial dos dirigentes, gestões amadoras ou irresponsáveis, mecanismos de fiscalização controle e punição praticamente nulos… pressão por resultados imediatos vindo da parte de conselho, torcida, mídia, investidores… gasta-se o que tem e o que não tem para montar time para ser campeão, ou pelo menos fazer frente ao clube rival!

Costumo dizer que o futebol brasileiro é meio que esquizofrênico! Até mesmo clubes sem um mínimo de estrutura, seja material, financeira, ou de gestão, cobram resultados! Parece que querem mágicos que façam os resultados aparecerem milagrosamente já no próximo jogo!

Mas não há mágica! O futebol, embora multifatorial e, por isto mesmo, longe de ser ciência exata, no fundo é simples de ser gerido, pelo menos conceitualmente falando. Basta uma mínimo de inteligência!

O Be-a-bá da gestão do futebol:

1) Sustentabilidade, senso de realidade e responsabilidade: Não gastar mais do que arrecada! Não contar com o ovo na barriga da galinha! Não querer ganhar a qualquer custo! Pensar no médio e longo prazo! A sustentabilidade, grosso modo, se traduz em algo que seja economicamente viável, socialmente justo e ecologicamente correto!

2) Credibilidade: Honrar compromissos, ser bom pagador! O que envolve também um plano de saneamento financeiro de um clube endividado, resgatando ou reconstruindo sua credibilidade. Os stakeholders passam a ver o clube com outros olhos, e a solidez, seriedade e responsabilidade mostradas no seu projeto, se refletem na atração de novos parceiros e investidores como consequência natural.

3) Gestão inteligente: Uma gestão de excelência no futebol deve ser calcada em um projeto consistente, coerente e exequível (pés no chão). Acreditar no que se propõe e não se desviar de seu foco por conta de possíveis maus resultados dentro de campo. Entender que etapas devem ser respeitadas e que, mesmo com a pressão por resultados imediatos, muito comum em clubes de massa, o clube deve saber qual é o seu lugar, sua missão, valores e propósito! Qual é a sua situação no presente, o seu potencial e onde quer chegar, mas respeitando uma sequência lógica para a construção de um ciclo virtuoso, o que só é possível no médio e longo prazo!

4) Eficiência: A minimização de despesas através do enxugamento da máquina, junto com a maximização de receitas através da inovação para criação de novos produtos e novas frentes de relacionamento com seu público consumidor, buscando, em última instância, o resultado operacional, o lucro… que por sua vez, é condição facilitadora para a performance!

4) Conquista de mentes e corações: Valorização e participação, gerando senso de pertencimento e de responsabilidade de todos os envolvidos no seu projeto, através de um organograma de cunho colaborativo (matricial). Gente engajada, proativa, comprometida e apaixonada pelo que faz! Que busca por capacitação continuada!  

5) Projeto científico: Embasar todas as ações relativas à formação e performance esportiva nas Ciências do Esporte, combatendo uma perniciosa cultura do empirismo, do “achismo”, das subjetividades e das opiniões ou experiências pessoais, tão arraigadas no nosso futebol. Frases abomináveis como “Futebol é assim mesmo!”, ou “Futebol aceita tudo!”, devem ser banidas por quem quer fazer a coisa certa! O embasamento científico não é sinônimo de que se vai ganhar tudo, afinal não se joga contra o vento e o futebol, além de multifatorial, talvez seja a modalidade mais sujeita ao imponderável, como por exemplo, aquela bola que bate na trave numa final… ou aquele pequeno erro de arbitragem que bota tudo a perder… Mas com certeza, embasar-se em ciência aumenta consideravelmente suas probabilidades de sucesso… e nada é mais importante do que a verdade, do que saber que se está no rumo certo!

6) Formação: Deve ser totalmente embasada no projeto científico do clube e envolver o seu DNA: Que tipo/modelo de jogo, de jogador, de homem, de envolvimento, de compromisso, de mentalidade, de cultura… se quer formar?! Consolidar firmemente uma cultura de amor ao jogo, de real prazer pelo futebol, de jogar se divertindo e se divertir jogando, não tendo medo de ousar, de arriscar, de tentar algo diferente: o drible, a finta, a jogada de efeito em busca de um futebol belo, ofensivo, vistoso, ousado, que encha os olhos! Para tanto, é necessário também uma cultura que respalde o trabalho dos treinadores de base, para que estes não joguem com medo de perder, sempre lançando os jogadores maturados para garantir resultados, ou tolhendo a tomada de decisão dos jovens jogadores, gritando-lhes o tempo todo do lado de fora do campo, quanto ao que devem fazer! Se empenhar na formação de novas gerações de atletas rápidos, técnicos, inteligentes, com uma profunda compreensão tática e do jogo, mas que sejam também cidadãos responsáveis e de valor!

7) Inteligência emocional: Saber muito sobre gestão de pessoas! Um grande clube envolve em seu departamento de futebol algo em torno de uma centena, ou até mais, de pessoas. Cada uma com sua história de vida, suas virtudes e fraquezas, seus problemas cotidianos. Eu acredito que  uma gestão mais humanizada do futebol é tendencia irreversível quanto mais se conhece sobre as ciências humanas em busca do desenvolvimento pleno do potencial humano. “Não sois máquinas! Homens, é o que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas!” (Charles Chaplin).

8) Ciclo virtuoso: Respeitando-se todas essas etapas, torna-se mais plausível a construção do chamado “ciclo virtuoso” do futebol: arruma-se a casa, implanta-se um projeto embasado, dá-se tempo ao tempo e os resultados virão em termos de revelações, bons times, performance esportiva, conquistas, retorno financeiro/ institucional, e o reinvestimento aprimorando ainda mais toda a estrutura construída! Um moto perpétuo de virtudes!

Não é difícil, desde que haja respeito às etapas e processos, e não se espere mágica!

 

Francisco Ferreira

Gestor de Futebol           

 

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