BRASILEIRÃO
Encerrado o Brasileirão 2023 e algumas constatações importantes:
O Palmeiras segue como a mais solidificada gestão do futebol do país e abre larga vantagem no ranking, contabilizando seu 12º título nacional. Tem um trabalho de base excepcional conduzido pelo JP Sampaio e que sempre tem suprido o time profissional com grandes talentos.
O Flamengo, pelo potencial financeiro, deverá continuar sempre nas cabeças, mas é um clube historicamente muito turbulento, muito passional, que exige resultados “para ontem” e onde não se tem muita paciência para respeitar etapas… não por acaso, carrega a fama de “triturador de treinadores”. Tem elenco estelar, mas que necessita mudanças, “sangue novo” para espantar um certo comodismo causado no elenco pelas conquistas de passado recente. Tite deve arrumar a casa, tem moral pra isso, é um mestre motivacional (vejam como já recuperou o Everton Cebolinha em tão pouco tempo!), mas se os resultados não vierem será questionado como todos os outros.
O Corinthians teve um ano medíocre, muito por conta de um elenco com muitos jogadores velhos. Observações feitas pelo amigo Thiago Freitas, então gestor do Estoril de Portugal, anos atrás, apontaram que equipes com elencos com idade média de 28 anos para cima, aumentam em até 50% as chances de rebaixamento. Não dá mais pra ter nos elencos tantos jogadores com baixa capacidade de corrida intensa (>20km/h) e de sprints (>25km/h). Para 2024, com nova diretoria e uma possível resolução da questão da dívida de seu estádio, apresenta-se o dilema de buscarem um equilíbrio entre saneamento financeiro, tipo Bandeira de Mello no Flamengo, que arrumou a casa, mas não conquistou títulos, ou contratações para satisfação imediata… Eu, se fosse o Augusto Melo, tentaria algo como o que fez o Bahia em anos recentes: Trazer a torcida pra perto, transparência, mostrar detalhadamente o que pensa e deseja, transpirar e vender credibilidade no sentido de conquistar mentes e corações para os projetos do clube! Se conseguir isso, a Fiel terá paciência para suportar um período de possíveis vacas magras, mas que dará frutos a partir do momento em que a casa estiver arrumada e o Timão poderá então se tornar mais poderoso financeiramente até mesmo do que o Flamengo pois, embora tenha torcida menor, ela mesmo assim é gigante e conta com a vantagem de estar concentrada em sua maior parte no maior mercado consumidor do país!
O Fluminense, mesmo sem tanto poderio financeiro, deve seguir como um dos protagonistas graças à continuidade do excelente trabalho de Fernando Diniz, Eduardo Barros & Cia. Espera-se que o acúmulo de funções entre clube e CBF não atrapalhe o projeto. Neste, tenho o espelho de uma das coisas que mais desejo e valorizo no futebol: uma gestão mais humanizada e que considere o jogador enquanto homem de carne e osso, pessoa, cidadão…
O São Paulo, o papão de títulos de décadas passadas e que havia de repente se tornado um clube tumultuado e hostil, que fazia contratações sem sentido e sem resultados pode estar entrando num ciclo de retorno aos seus dias de glória com a conquista da Copa do Brasil. Dorival não é nenhum sumidade, mas tem um perfil de eficiência e boa gestão de grupo.
O Botafogo foi o vexame do século! Inadmissível deixar escapar um título desses depois de chegar a colocar 16 pontos de frente. Acredito que a falta de conhecimento da cultura do futebol da parte de seus gestores, oriundos do mundo corporativo, possa ter influenciado. Algumas perguntas: Aquele time modesto, sem estrelas, mas que fez um 1º turno brilhante, cairia tanto caso Luís Castro permanecesse? Será que não fizeram um processo seletivo mais criterioso para detectar que o Bruno Lage não dava a mínima para ambiente e cultura do futebol brasileiro? Este mesmo erro já fora cometido pelo Cruzeiro quando contratou Paulo Bento em 2016. E será que a manutenção do meu amigo e grande caráter Cláudio Caçapa não teria sido a solução?
O Santos é o reflexo de uma péssima administração. Foi uma bagunça o ano inteiro com vexamos também no Paulistão, na Copa do Brasil e, com gente enganadora, que já fez de tudo dentro do futebol mas nunca se firmou/destacou em nenhuma função, em cargo chave, não poderia se esperar melhor sorte… Mereceu como poucos o seu inédito rebaixamento!
O Bahia ainda na transição para SAF, deve se consolidar com o aporte do Grupo City e a modernização de seus processos e estruturas ora em curso.
O Vasco na mesma situação de transição e acomodação das outras SAFs, mas precisa ver se o grupo 777Partners é mesmo sério. Pedrinho, meu colega de turma na Licença A da CBF deverá ser um grande dirigente, pois conhece muito de futebol.
O Cruzeiro Estive esta semana na Toca II em visita proporcionada pelo grande e competentíssimo amigo, Paulo Autuori e fiquei bem impressionado com o projeto em curso. A ênfase em um departamento científico com foco prioritário na performance e no controle de cargas, liderados pelo não menos competente Túlio Flores, foi o que mais saltou aos olhos.
Fiquei feliz por ver que é algo parecido com o que eu já havia proposto tempos atrás ao Cruzeiro: primeiro em 2010, quando eu ainda trabalhava no clube e depois em 2020 quando assumiu o presidente Sérgio Rodrigues. Neste intervalo, efetivamente tentei difundir mais tais conceitos no futebol brasileiro ao promover a vinda para cursos aqui, por quase uma dezena de vezes, dos geniais Raymond Verheijen (Holanda) e Tim Gabbett (Austrália), ambos com metodologias fundamentadas nestes princípios do controle de carga, condicionamento x freshness, carga aguda x crônica, etc., etc.
Performance atlética está fundamentada hoje em força, mais precisamente em cadeias musculares, força específica e funcional que promova qualidade de movimentos. Os americanos da Exos é que difundiram essa linha. E a preparação hoje é sistêmica, voltada para um “jogar futebol de forma eficiente” e não para um mero “correr mais”! Essa já é um legado dos portugueses adeptos da Periodização Tática.
Trata-se de um caminho sem volta. Uma profissionalização completa e uma real valorização da esfera técnica – científica, com os gestores finalmente compreendendo e aceitando que a esfera político – administrativa não pode continuar sendo onipotente e ignorante. A era da gestão racional está aí: projeto consistente e que seja bancada a sua continuidade mesmo contra a possível ausência de resultados esportivos imediatos; respeito a prazos, etapas, processos, sequencias, alinhamentos, controles, etc., etc.
Acredito que podemos estar vivenciando uma fase de transição de um modelo de comando muito personalista, fundamentado nas figuras e carismas de dirigentes e treinadores, que muitas vezes aceitava tudo, para um modelo mais corporativo de liderança, autonomia e poder de decisão a figuras como o diretor técnico, diretor de planejamento, head of performance, dentre outros. Neste sentido, acredito muito no modelo de organograma matricial implantado pelo Athletico PR e ora replicado no Cruzeiro.
Uma autonomia para direcionar ou determinar “O QUE” deve ser feito em termos de trabalho visando a performance (embasado em referências objetivas e não no subjetivismo, experiências ou opiniões pessoais), ficando “O COMO” por conta do treinador e sua comissão.
Uma situação que vivenciei por muitos anos no futebol foi a quebra de continuidade e de metodologias, com as opiniões e condutas pessoais diferentes de cada treinador e preparador físico que chegava. Perdemos alguns títulos importantes exatamente por essa falta de uma visão mais científica da coisa por parte dos gestores dos clubes. Vi de tudo: Era o treinador que só decidia o que iria ser o treino na beira do gramado; o preparador que odiava trabalho de força e adorava treino aeróbico; outro adorava baterias de tiros de 400m mas não sabia de onde vinha tanta lesão de isquiotibiais; o outro que adorava musculação no dia seguinte ao jogo; o que dizia pro jogador não fazer banheira depois da caixa de areia pra “não cortar o efeito do treinamento”! PQP! PQP! PQP! Outro que deu bateria de tiros de 400m em outubro, dois dias antes de um jogo, e sem nunca ter feito esse treino ao longo do ano! PQP! PQP! PQP!; era a comissão técnica feita só de amigos babando ovo pro chefe… Há no futebol muitas coisas a serem lidas nas entrelinhas. Já peguei comissão técnica do treinador, cuja função primordial da mesma era nada mais, nada menos, do que “blindar o chefe”! Já para a comissão técnica permanente, a função é fazer o time render em campo! PONTO!
Vejo o Cruzeiro atual no rumo certo para construir a sua própria ‘Escola do Futebol”. Analisar exaustivamente os profissionais visados para ver se estão dentro do perfil desejado pelo clube, é o primeiro passo. O clube vai conseguindo aos poucos implantar seu projeto próprio com os pontos chamados inegociáveis desde a base: priorizar a seleção pela técnica e deixar o físico em um segundo escalão; estimular o prazer e amor pelo jogo; se divertir jogando, ousar; impor seu futebol…
Neste ano, houveram muitos desafios e momentos de tensão. Pezzolano colocou a diretoria em uma sinuca. Não estava com a cabeça aqui e a diretoria não tinha como substitui-lo rapidamente. Pepa foi uma grata surpresa no início, mas se perdeu na falta de resultados pela ineficiência ofensiva, que foi a tônica do time ao longo do ano. O bom futebol apresentado em jogos como o de ontem contra o Palmeiras, além de Athletico, Atlético, Goiás, Bahia, etc., foi a constatação de que os valores de ofensividade estão presentes, mas falta uma maior qualidade individual. Um erro de cálculo que acredito, não será repetido, até porque, a partir de 2024, o clube volta a receber cota integral da TV e recebe ainda o aporte da Liga Forte. Acredito que vai dar pra formar bom time.
É um clube que atua dentro daqueles 3 pilares da gestão de excelência do futebol que tenho sempre defendido (RH, Financeira e Técnica) e onde acho que o RH é a base: PESSOAS COMPETENTES, dentro do perfil desejado, mas também da REALIDADE financeira, e uma GESTÃO FINANCEIRA responsável, também conduzida por gente competente, ajudarem a construir um projeto TÉCNICO CONSISTENTE, sólido, embasado e contínuo para, no devido tempo, consolidarem a sustentabilidade de um Ciclo Virtuoso do futebol.
O Grêmio segue com seu comando personalista muito focado na figura carismática do Renato. No âmbito doméstico dá pro gasto, mas no cenário mais amplo fica onde está… acho que aquela Libertadores de 2017 foi um ponto fora da curva! Luan e Arthur voando baixo, mas depois desapareceram! Neste ano, Luizito Suárez foi o seu diferencial, mas vai embora deixando muitas saudades aos seus torcedores. Uma observação: aqui ele foi um diferencial, mas na Europa não serve mais para um Barcelona… mas é lógico que eu queria ele no meu time!
O Atlético teve uma espantosa recuperação no 2º turno, graças em muito ao excelente trabalho do amigo Cris Nunes (que tem a mesma autonomia de um Head of Performance) e ao carisma e liderança de Felipão: futebol feijão com arroz, mas eficiente, e maestria na gestão de grupos! Para o ano que vem, tem um bom time e pode ser protagonista.
O Inter como conheço pouco, segue meio como incógnita. O maluco do Coudet, tendo continuidade e cabeça no lugar, pode fazer bom papel.
O Atlhetico segue como clube modelo no futebol brasileiro. É o meu sonho de consumo!
Bragantino, Cuiabá e Fortaleza como forças emergentes e com boas gestões permanecem por méritos na Série A.
América, Goiás e Coritiba sendo aquilo que a realidade lhes permitiu. Não dava mesmo para competir, pelos seus portes e orçamentos, contra os grandes até que uma Liga Nacional com distribuição mais igualitária de recursos, possa equilibrar um pouco mais o cenário. Até lá, continuarão sendo clubes ioiôs. Mesma realidade daqueles que sobem para o próximo ano: Vitória, Criciúma, Juventude e Atlético GO.
Saudações e ótimas festas!
Francisco Ferreira
Gestor Esportivo
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